¹ O que antecipou e atrasou: o que fez e o que deixou de fazer.
Saberá cada alma o que fez e o que deixou de fazer.¹
Prof. Samir El Hayek, 1974
¹ “O que fez e o que deixou de fazer” talvez signifique os feitos realizados e os omitidos desta vida. Ou, ainda, as palavras árabes poderão ser traduzidas por “o que fez e o que deixou de fazer”; isto é, as possibilidades espirituais, que ele diligenciou para a sua outra vida, e as coisas materiais, das quais ele se ufanou nesta vida, mas das quais teria de abrir mão. Ou, por outra, as coisas que ele considerou como de primeiro plano e as que considerou de segundo, talvez troquem de lugar, no mundo novo da Realidade. “Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros.”
Cada alma saberá o que tiver feito ou deixado de fazer.
Mansour Challita, 1970
Cada alma saberá o que ela há feito e o que há deixado de fazer.
¹ Comparar com o versículo 6 da 81ª Surata, “Quando os mares transbordarem”. Aqui “Quando os oceanos forem despejados”, expressa o fim da presente ordem das coisas, que pode ser de duas maneiras, se interpretado literalmente: (1) a barreira, que conserva dentro dos seus respectivos limites os vários fluxos, de água salgada e doce, será retirada; (2) o oceano avassalará todo o globo. Em sentido figurado, os diferentes mananciais de conhecimento, grande e pequeno, serão nivelados; porque somente um conhecimento, a Luz Divina, dominará o campo.
Quando os mares transbordarem,
Mansour Challita, 1970
E quando os mares forem derramados para fora, nas canais,
¹ Kaukab, aqui, tem mais o significado de um planeta fixo numa constelação; e o oposto de uma ordem fixa e definida é “dispersada”, o verbo aqui usado. Como de fato, por toda esta passagem, a idéia dominante é a de perturbação da ordem e da simetria. A metáfora, por trás da dispersão das constelações, é que na presente ordem das coisas, nós vemos muitos ajustes conjuntamente associados, como, por exemplo, linhagem com honra, riqueza com conforto, etc.. No novo Mundo Espiritual, estas coisas parecerão ser meramente fortuitas.
¹ Al Infitar: infinitivo substantivado de infatara, espedaçar-se, cujo passado aparece no versículo 1, e, a partir do qual se nomeia a sura. Esta relata, de início, eventos que ocorrerão, quando da aproximação da Hora; em seguida, admoesta o ingrato ser humano e condena sua descrença no Dia do Juízo, ratificando a existência dos anjos da guarda, que anotam todos os atos do homem. Assinala as delícias que gozarão os virtuosos, e os suplícios que padecerão os pecadores; então, ninguém poderá interceder por outrem, e só Deus disporá de tudo.
¹ Na literatura ocidental, especialmente em alegorias religiosas, há comumente mais de um significa, compreendo outros. Estes devem ser entendidos, se os leitores desejam um completo sentido da passagem. E esta especialidade cabe somente ao Alcorão. O significado paralelo considera seis fatos materiais (versículos 1 a 6) como alegóricos: (1) o sol é o centro do sistema solar; assim também o nosso ser interior é o centro das nossas intenções e dos desejos comuns; a luz desse ser inferior deverá ser empanada, para que dê lugar à luz da Realidade; (2) a luz menos intensa, a das estrelas, é o nosso saber humano comum; ela deverá ser retirada, antes de readquirirmos visão espiritual; (3) as nossas ambições terrenas são representadas pelas montanhas, as quais deverão, similarmente, desaparecer; (4) a cupidez e a usura são as camelas, prestes a dar cria, que deverão ser deixadas de lado; (5) as nossas paixões são representadas pelos animais selvagens, que deverão ser domados; (6) os oceanos da graça divina deverão transbordar e cobrir todo o nosso ser. Tudo isto deverá acontecer em qualquer tempo, mesmo a um indivíduo, nesta vida, quando a Glória de Deus se derramar sobre ele.
E quando os camelos fêmeas,¹ prestes a dar à luz, forem descurados,
Dr. Helmi Nasr, 2015
¹ Os árabes sempre investem muitos cuidados nas fêmeas prenhes dos camelos, pois delas depende, em grande parte, sua subsistência e prosperidade. O versículo, para conotar o terror que será essa Hora, mostra que esses animais, tão estimados, estarão totalmente desamparados, sem pastor, sem mungidor, sem nada.
Quando as camelas, com crias de dez meses, forem abandonadas,
Prof. Samir El Hayek, 1974
Quando as fêmeas grávidas dos camelos forem abandonadas,
Mansour Challita, 1970
E quando as camelas com as crias de dez meses forem abandonadas,
¹ At-Takuir: infinitivo do verbo kawwara, enrolar, cuja forma passiva é mencionada no versículo 1, e a partir da qual se nomeia a sura. Aqui, há descrição dos eventos que ocorrerão, antes e depois do Dia da Ressurreição; há, também, exposição dos fenômenos que atestam o poder divino, e confirmação do valor do Alcorão, e refutação das difamações contra ele, com defesa do Profeta e ameaça aos transgressores. Finalmente, a sura aponta orientação sobre o ensinamento do Alcorão, sempre lembrando que tudo no mundo está submetido à vontade de Deus. ² Ou seja, quando desaparecer a luz do sol.
Quando o sol for enfolado,¹
Prof. Samir El Hayek, 1974
¹ Os versículos de 1 a 13 constituem-se de cláusulas temporais, sendo que a cláusula substantiva começa no versículo 14. Tempo virá em que os processos da natureza, como os conhecemos, deixarão de funcionar, e as almas só então terão, por convicções próprias, conhecimento dos resultados das suas ações. Com referência à alma individual, sua ressurreição e suas supremas crises, todo o mundo dos sentidos, e a mesmo da imaginação e da razão, desvanecer-se-á, e todo o seu rol espiritual será exposto, perante ela. As cláusulas temporais são em número de 12, divididas em dois grupos de seis. As primeiras seis dizem respeito à vida exterior e material do homem; as últimas seis, à sua vida interior e espiritual. Estudemo-las uma a uma. Os fatores mais importantes, que nos afetam no mundo exterior e material, são: a luz, o calor o talvez a energia elétrica e magnética do sol. O sol é a fonte de toda a luz, de todo o calor e de toda a energia, e com certeza a fonte de toda a sustentação da vida material que conhecemos. Ele é o fator mais importante da vida e, no entanto, é o mais remoto dos corpos, em nosso sistema solar. O sol, como o centro do nosso sistema solar, também se apresenta como um símbolo da presente ordem das coisas. As forças físicas, definidas nas Leis da Matéria e da Gravidade de Newton, chegarão ao fim, com o desaparecimento do sol.
E também haverá, nesse dia, rostos cobertos de pó,¹
Prof. Samir El Hayek, 1974
¹ O pó, nos rostos dos pecadores, contrastará com o brilho resplandecente nos rostos virtuosos; a lugubridade, nos rostos daqueles contrastará com “risos e regozijos”, nos rostos destes. Mas o pó sugere ainda que, sendo dos que rejeitam Deus, seus rostos e olhos e faculdades estão mergulhados nas trevas, e a lugubridade sugere que, por praticar a iniqüidade, não têm direito a pureza alguma ou a porções da Luz. Outro contraste pode, possivelmente, ser deduzido: os humildes e os de baixas condições de vida podem estar no “pó”, neste plano, e os pecadores, arrogantes, à luz do sol; mas os papéis reverter-se-ão, no Dia do Julgamento.
¹ Tudo na terra foi, pela generosa providência de Deus, disposto para prover o homem segundo o seu uso de conveniência, bem como a vida inferior que depende dele. A mediação entre a providência de Deus e o virtual uso de outras dádivas divinas é a própria inteligência e iniciativa do homem, que também são dádivas de Deus.